Poemas de Ferreira Gullar
Do livro: Um gato chamado Gatinho
O ron-ron do gatinho
O gato é uma maquininha
que a natureza inventou;
tem pêlo, bigode, unhas
e dentro tem um motor.
Mas um motor diferente
desses que tem nos bonecos
porque o motor do gato
não é um motor elétrico.
É um motor afetivo
que bate em seu coração
por isso ele faz ron-ron
para mostrar gratidão.
No passado se dizia
que esse ron-ron tão doce
era causa de alergia
pra quem sofria de tosse.
Tudo bobagem, despeito,
calúnias contra o bichinho:
esse ron-ron em seu peito
não é doença - é carinho.
O gato curioso
Era uma vez era uma vez
um gato siamês.
Por ser muito engraçadinho,
é chamado de Gatinho
Além de ser carinhoso,
ele é muito curioso.
Nada se pode fazer
que ele não deseje ver.
Se alguém mexe na estante,
está lá no mesmo instante.
Se vão consertar a pia,
está ele lá de vigia.
E o resultado é que quando
viu seu dono consertando
a tomada da parede,
meteu-se com tanta sede,
a cheirar tudo que – nhoque!
levou um baita de um choque!
E pensa que ele aprendeu?
Mais fácil aprendia eu!
Mantém-se o mesmo abelhudo
que quer dar conta de tudo.
Gato pensa?
Dizem que gato não pensa
mas é difícil de crer.
Já que ele também não fala
como é que se vai saber?
A verdade é que o Gatinho,
quando mija na almofada,
vai depressa se esconder:
sabe que fez coisa errada.
E se a comida está quente,
ele, antes de comer,
muito calculadamente
toca com a pata pra ver.
Só quando a temperatura
da comida está normal,
vem ele e come afinal.
E você pode explicar
como é que ele sabia
que ela ia esfriar?
A fala do gato
O gato siamês
tem uns vinte miados:
alguns são suaves,
outros exaltados;
há os miados graves
e há os engasgados.
É quase um idioma
que ainda não entendo
mas o gato bem sabe
o que está dizendo.
E até falou comigo
em linguagem de gente.
Disse: “meu amigo”,
assim de repente.
Então eu acordei
feliz e contente!
Era sonho, claro.
Mas, como se sabe,
é no sonho que ocorre
o que se deseja
e no mundo não cabe.
Companheiro fiel
Se estou trabalhando
– seja a que hora for –
Gatinho se deita ao lado
do meu computador.
Se vou para a sala
E deito no sofá,
Ele logo vai pra lá.
Se à mesa me sento a escrever poesia
e da sala me ausento
pela fantasia, volto à realidade
quando, sem querer,
toco de revés
numa coisa macia.
Já sei, não pago dez:
é o Gatinho que sem eu saber
veio de mansinho
deitar-se a meus pés.
Dono do pedaço
Para qualquer outro gato,
Gatinho não dá espaço.
Em nossa casa ele impera
– é o dono do pedaço.
Certa vez uma vizinha
– que era de fato uma tia –
pediu pra deixar seu gato
conosco só por um dia.
Mal o gato entrou em casa,
Gatinho se enfureceu,
pulou em cima do intruso
que, assustado, correu.
Gatinho saiu-lhe atrás
aos tabefes e às unhadas,
correram os dois pela casa
na mais louca disparada.
No quarto, em volta da cama,
por baixo e por cima dela,
rodaram como foguetes,
sumiram pela janela.
Só depois de muito esforço,
pude conter o Gatinho,
enquanto o outro fugia
pro apartamento vizinho.
Assim acabou-se a guerra
que me serviu de lição:
proibo a entrada de gatos;
só gatas têm permissão.
Final
Era o que eu tinha a contar
sobre o meu gato Gatinho
que muito tem me ensinado
de amizade e de carinho.
Um siamês, pêlo escuro,
olhos azuis, cara preta,
é o bicho – lhes asseguro –
mais “fofo” deste planeta.
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Ferreira Gullar
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