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quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

A magia do não


Nos dias de hoje, vivemos sob a égide de uma ética hedonista que grassa na sociedade como um todo. Isso quer dizer que é preciso viver o "aqui e agora", e com o máximo de prazer. A busca do prazer não é a mesma coisa do que a busca da felicidade, embora isso pareça paradoxal. É mais fácil conquistar-se o prazer do que a felicidade e muitos parecem confundir uma coisa com a outra. Freud mostrou que o prazer, para trazer felicidade e bem-estar, deveria submeter-se às leis da civilização, o que quer dizer: esperar o momento certo para realizar o desejo. A felicidade está mais associada a um estado de harmonia, que tem muito pouco a ver com o mundo em que vivemos, aonde as coisas têm que acontecer rapidamente, ou se tem a impressão de não se estar vivendo.

Os relacionamentos duram cada vez menos. Desfazem-se quando um ou outro decide abandonar tudo e ir em busca de uma felicidade que não sabe construir, com a esperança que esta lhe chegue como uma dádiva, um presente dos céus, pronta para ser usada. Isso faz com que se fique enfeitiçado pelo prazer que as relações proporcionam quando se iniciam.

Muitos homens, que antes traíam a mulher contando com sua condescendência altruísta ou submissão às vezes interesseira, se mostram, hoje, arrasados diante da comunicação de que sua parceira está determinada a romper a relação. A perda do poder masculino, diante das conquistas da mulher no que toca à igualdade de direitos, pode derrubá-los e torná-los implacáveis em suas vinganças.

Os jovens, que descobriram uma forma de ter alguém para viver um simulacro de amor, sofrem quando aqueles com quem "ficam" surgem com uma namorada ou um namorado: aquele que se comprometeu se torna especial, desejado e o que se contentava apenas em ficar sente-se traído e sua auto-estima desaba. Os homens, porém, levam vantagem por existirem em minoria. Alguns fazem valer o poder que lhes resta: se a companheira mostra alguma independência que faça o namorado ou o marido suspeitar de que existe algo para ela tão ou mais importante do que ele, apelam para retaliações capazes de minar a relação dos dois. Aquele que é preterido raramente mostra uma postura de dignidade, em que o desprezo pelo outro seria, talvez, o sentimento mais adequado. Ao contrário, apaixona-se.

Nada como inseminar no outro a dúvida de que ele não satisfaz. Nada melhor, para despertar sentimentos exaltados, do que quando se mexe com o narcisismo de alguém: "Espelho, espelho meu, existe alguém melhor do que eu?" perguntam-se inconformados os que se sentem trocados por outra pessoa. Nada mais excitante do que obstáculos para o aparecimento e a manutenção de uma paixão.A frase "vivo muito bem sem você", implícita no término do relacionamento ou antes da conquista é difícil de digerir.

Parceiros que se relacionam como se fossem uma só pessoa podem tirar do "não", contido na ruptura da relação, a experiência definitiva que Roland Barthes tão bem expressa: "ele diz uma palavra diferente (que pode ser o "não") e ouço rugir de um modo ameaçador todo um outro mundo, que é o mundo do outro". A frase de Barthes revela uma obviedade negada: "Eu não sou você, eu sou outra pessoa, eu existo com o meu desejo e o meu desejo não mais se dirige a você."

No primeiro momento, surge uma sensação de empobrecimento e a certeza de que a parte mais valiosa de si ficou com o outro; depois, a pessoa percebe o que lhe pertencia e que havia perdido de vista e, em seguida, a tendência saudável é recuperar a auto-confiança.

O "não", depois que transpõe a fase de sedução, pode dar ensejo, tanto aos que o ouvem como aos que o dizem, a que iniciem um novo ciclo de vida, com mais consciência e possibilidade de acerto

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